quarta-feira, 11 de maio de 2011

Auto-ajuda - 2º ano do Ensino Médio.


Houve um tempo em que as listas de livros mais vendidos dividiam-se em duas categorias. Na primeira, estavam os livros de ficção: romances, novelas, coletâneas e contos. Na segunda os livros de não ficção: memórias, biografias, ensaios literários. Mas lá pelos anos 60. a lista de não ficção passou a exibir títulos bem diferentes. Eram manuais de auto conhecimento, dicas para um casamento mais feliz, fórmulas para que o leitor pudesse ser bem sucedido. Os editores dos suplementos e seções especializadas apavoravam.. Afinal, aquelas obras, vistas como um gênero menor, começaram a não deixar espaço nem para trabalhos de inegável qualidade literária. Assim, em 1983, o New York Times criou uma lista exclusiva para o que foi chamado de “livros de aconselhamento”.
De 2000 a 2004, o mercado americano desses livros cresceu 50%. No Brasil a cifra é ainda mais impressionante. Enquanto o mercado editorial cresceu 35% na última década, o filão de auto-ajuda acumulou impressionantes 700% de aumento.
O arrebatamento de leitores pelo mundo foi acompanhado por um proporcional aumento das críticas. Nenhum outro gênero literário sofre tantos bombardeios: os livros são chamados de pobres, superficiais e até de alienadores. Mas o que a demanda por eles diz sobre a sociedade em que vivemos? E é possível tirar algum proveito da ajuda oferecida por eles?

COMO TUDO COMEÇOU?
Uma das acusações formuladas contra o gênero de auto- ajuda diz que os livros criam pessoas alienadas, incapazes de tomar atitudes. Assim, não deixa de ser irônico que o pioneiro do gênero, o cara que inclusive cunhou o termo para o qual os literatos torcem o nariz hoje em dia, tenha sido o médico escocês Samuel Smiles. Smiles ( cujo sobrenome significa sorrisos em português, dando um tom ainda mais irônico à história) abandonou a medicina em 1830 para se tornar uma das figuras mais engajadas da política de sua época. Foi um dos principais defensores de ideais como o voto secreto e abolição da comprovação de renda para candidatos a cargos legislativos.

COMO RECONHECER UM?
Se você entrar em uma livraria, não vai ter grandes problemas em reconhecer os livros de auto-ajuda. Basta se dirigir a maior prateleira da loja. Mas talvez não seja tão fácil definir o que faz e o que não faz parte do gênero. A obra de Paulo Coelho, por exemplo, costuma receber a etiqueta. “É a temática esotérica que o aproxima do gênero de auto-ajuda. Mas não há dúvidas de que os livros de Paulo Coelho são romances, ou novelas” , diz o historiador gaúcho Mário Mestri, autor de Por Que Paulo Coelho Teve Tanto Sucesso.
Ao contrário dos títulos de Paulo Coelho, livros de auto-ajuda não são romances, mas ensaios: textos analíticos sobre um assunto específico. Eles se dirigem diretamente ao leitor, tratando-o de forma pessoal. Falam com “você”. Não é à toa que, em inglês, recebam a denominação “livros de aconselhamento”. O objetivo deles é servir ainda que temporariamente, com um amigo ou professor que sempre tem uma palavra de apoio na ponta da língua. Aliás, e apesar de não haver estudos específicos sobre reações cerebrais e livros de auto-ajuda, alguns psicanalistas acreditam que as mensagens contidas neles atuam no cérebro da mesma forma que uma conversa com pessoas em que confiamos: estimulam o lado direito do cérebro, responsável pelas emoções, e ativam a área responsável pelo prazer.
É para que esse “papo” tenha ainda mais efeito que os livros costumam usar letras grandes, tabelas e recapitulações. A idéia é facilitar o quanto puderem a leitura. Nesse sentido, outro trunfo do gênero são as metáforas. “Tudo o que você precisa é lapidar o diamante bruto que há dentro de você” é um exemplo de mensagem de alguns dos best sellers do gênero. Essas comparações podem ajudar o leitor a entender mais claramente algo que ele intuía ajudando-o a modificar comportamentos. Mas há quem diga que o uso recorrente deste artifício não passa de uma tentativa de maquiar idéias óbvias.
Outra característica típica é a promoção da idéia de que você é o único responsável por sua felicidade e pode se aprimorar confiando única e exclusivamente em seus poderes interiores. “ Quando as pessoas se voltam à cultura de auto-ajuda, elas estão apostando em sua invencibilidade – e negando a vulnerabilidade e fragilidade humana”, diz a socióloga Micki McGee, da Universidade de Nova York.

POR QUE TANTO SUCESSO?
A explicação mais recorrente é exatamente a promessa de que podemos, sim, driblar os sacrifícios, romper os paradigmas e sermos felizes. “ A burguesia, a classe social conduz a era moderna, acabou com o sofrimento e impôs a felicidade como regra”, escreveu o filósofo Pascal Bruckner em A Euforia Perpétua. Para Bruckner, essa obrigação nos coloca em condições ideais de consumir fórmulas milagrosas, entre elas todo tipo de auto-ajuda. “ Existe um arsenal de apetrechos que tenho chamado de felicidade automática”, escreveu Bruckner.
Além disso, a falta de rumo decorrente das mudanças comportamentais do século XX acabaram por deixar as pessoas cada vez mais carentes de um manual ( ou um guru ) que lhes explique o que fazer e como. Hoje, esses livros ocupam um lugar que, antigamente, as religiões ocupavam, diz a psicanalista Giselle Groeninga, diretora do instituto de Direito da Família.
Realmente tempos bicudos na economia ou política ou períodos de grandes mudanças de comportamento parece favorecer o consumo de livros de auto-ajuda. De acordo com a Câmara Brasileira do Livro, a maior expansão no Brasil aconteceu na época do chamado do confisco do ex-presidente Fernando Collor de Mello. Em 1994, 107 títulos venderam 410 mil exemplares no país, um recorde que ainda não foi batido.
Em 2001, uma pesquisa patrocinada por entidades do mercado editorial brasileiro sugeriu ainda uma outra explicação para o fenômeno. O típico leitor do gênero é um trabalhador assalariado, das classes B e C, que ganha entre 500 e 3 mil reais por mês. Ou seja, é alguém em busca de ascensão social.

ELES FUNCIONAM?
O que ganhamos em troca dos 8,5 bilhões de dólares que gastamos com auto-ajuda todos os anos?” Escreveu Steve Salerno na introdução do livro Sham. “ A resposta: não há como saber. Tanto dinheiro e tão poucos resultados documentados.” Realmente, é muito difícil fazer qualquer afirmação conclusiva sobre os benefícios de tantos livros, cursos e palestras, já que não há quase nenhum registro sobre o assunto. E um dos problemas é que isso acaba criando uma série de mitos. “ Algumas pessoas costumam dizer, por exemplo, que mulheres lêem mais auto-ajuda. Nas informações que revisei, eu não encontrei confirmação para esses dados”, diz McGee.
Os levantamentos de editoras sobre público –alvo mostram que o leitor que comprou um livro sobre como melhorar o casamento vai comprar todas as outras obras lançadas sobre o assunto. “ Esse dado me impressionou. Tudo bem que pessoas apaixonadas por animais de estimação leiam tudo sobre o assunto, mas no caso de auto-ajuda a coisa é diferente. O s livros prometem resolver o seu problema – ou ao menos aliviá-lo. As pessoas não deveriam precisar de mais e mais ajuda naquela área”, escreveu. A conclusão a que ele chegou é que os consumidores desses livros não aprendem com eles, apenas passam a viver num mundo de fantasia enquanto dura a leitura.
Já os autores recorrem a dois argumentos principais para provar a eficiência dos seus livros: o fato de que eles vendem muito (ou seja, satisfazem os leitores) e o fato de estarem no mercado há anos e conquistando cada vez mais espaço.

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